“E são as Escrituras que testemunham a meu respeito; contudo, vocês não querem vir a mim para terem vida´ [Jo. 5:39-40]. Nessas palavras o propósito da Escritura se torna claro. Longe de ser um fim em si mesma, ela é um meio para encontrar vida em Cristo. Portanto, ela dá testemunho dele para que as pessoas venham a ele e recebam vida. No entanto, os judeus não entendiam essas duas ideias.
Primeiro, eles deveriam ter visto Cristo na Escritura. (…) De fato, as três pessoas da Trindade estão envolvidas na Escritura, pois ela é o testemunho do Pai sobre o Filho por meio do Espírito.
Sem dúvida, Jesus se referia ao Antigo Testamento, que é um livro de esperança, de expectativa não cumprida. Do início ao fim, ele aponta para Cristo. Suas muitas promessas em Abraão, Moisés e os profetas se cumprem em Jesus. Sua lei, com rígidas exigências, foi ´o nosso tutor até Cristo´ [Gl. 3:24], mantendo-nos confinados e restringindo-nos, a ponto mesmo de escravizar-nos, até que Cristo nos libertasse. Seu sistema de sacrifícios, ensinando que sem derramamento de sangue não poderia haver perdão, esperava o singular derramamento de sangue do Cordeiro de Deus. Seus reis, apesar de todas as imperfeições, prenunciavam o reino perfeito de justiça e paz do Messias. E todas as suas profecias estão focadas nele. Portanto, Jesus Cristo é a semente da mulher que esmagaria a cabeça da serpente, a descendência de Abraão por meio de quem todas as famílias da terra seriam abençoadas, a estrela que sairia de Jacó e o cetro que surgiria de Israel. Jesus Cristo também é o sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque, o rei da linhagem de Davi, o servo do Senhor que sofreria e morreria pelos pecados do povo, o Filho de Deus que herdaria as nações e o Filho do homem, vindo com as nuvens do céu, a quem seriam dados domínio, glória e um reino para que todos os povos, nações e línguas lhe servissem para sempre. Direta ou indiretamente, Jesus Cristo é o grande tema do Antigo Testamento. Foi assim que ele pode explicar aos seus discípulos ´o que constava a respeito dele em todas as Escrituras´ [Lc. 24:27].
Os contemporâneos de Jesus tiveram o grande privilégio de testemunhar o cumprimento de toda essa série de profecias acumuladas. ´Felizes são os olhos de vocês´ – disse Jesus aos seus discípulos – ´porque veem; e os ouvidos de vocês, porque ouvem. Pois eu lhes digo a verdade: Muitos profetas e justos desejaram ver o que vocês estão vendo, mas não viram, e ouvir o que vocês estão ouvindo, mas não ouviram´ [Mt. 13:16-17]. Os judeus incrédulos, no entanto, não o viram. Eles nem sequer o viram na Escritura! Apesar de seu estudo entusiasmado da Escritura, eles não perceberam o tema principal dela.
Se Cristo é o coração do Antigo Testamento, isso é ainda mais evidente no Novo. Os evangelhos descrevem sua carreira terrena, seu nascimento virginal e sua vida sem pecado, suas palavras graciosas e suas obras poderosas, sua morte que levou o pecado, sua gloriosa ressurreição e ascensão. O livro de Atos descreve seu dom do Espírito por intermédio de seus apóstolos. As epístolas revelam de forma mais plena a glória extraordinária de sua Pessoa divino-humana, de sua obra salvífica e de seu reino vindouro, e nos dizem como devemos viver à luz dessas verdades. Apocalipse tira nossos olhos da terra e da história e os coloca no céu, onde vemos o Cristo compartilhar o trono de Deus, e no fim, quando ele virá outra vez em majestade, tomará seu poder e reinará. Contudo, há algumas pessoas que conseguem ler toda a Bíblia, tanto o Novo Testamento como o Antigo, sem perceber que seu principal objetivo é falar de Jesus Cristo!
A Bíblia está repleta de Cristo. Alguns dos antigos comentaristas ingleses diziam o seguinte: Assim como na Inglaterra toda estrada, travessa e caminho que se interligam irão levá-lo, por fim, a Londres, na Bíblia todo livro, capítulo e versículo interligados irão levá-lo, por fim, a Cristo.”
(JOHN STOTT, “As controvérsias de Jesus”, Editora Ultimato, pp.81-82)